PARTE IMPORTANTE DO EMPREGO EM PORTUGAL,
É EMPREGO NÃO
REMUNERADO
Há dias, no discurso de encerramento da
Universidade de Verão do PSD, Passos Coelho disse que “houve um aumento do emprego não remunerado e que esse emprego
justifica uma "parte significativa" do aumento do emprego que se
verificou no último trimestre, (…) comparando este tipo de emprego com o
trabalho voluntário e recordando que Catarina Martins sempre recusou a
colocação de desempregados e beneficiários de prestações sociais em IPSS.”
Passos Coelho fez notar ainda, “que desses novos empregos, 7.200 são de "trabalhadores familiares não
remunerados" (o que representa mais de 30% dos novos empregos
criados). No entanto, o impacto de todos os trabalhadores não remunerados
(que no total do segundo trimestre atingiu os 28.700) na população empregada
(mais de 4.6 milhões) ronda, tradicionalmente, os 0,5 a 0,8% desse total.” Mas quem são os “trabalhadores familiares não
remunerados?” Segundo o INE (Instituto Nacional de Estatística), este tipo
de trabalhador define-se com sendo o “indivíduo
que exerce uma atividade independente numa empresa orientada para o mercado e
explorada por um familiar, não sendo, contudo, seu associado nem estando
vinculado por um contrato de trabalho. ([i])”.
Liliana Valente ([ii])
depois de afirmar que “avaliando
trimestres seguidos, o número total de trabalhadores não remunerados vem subindo
e descendo”, analisa outro facto: a afirmação de Passos Coelho quando
compara o presente tipo de emprego ao “voluntariado.,
Diz a jornalista que a ideia ”está errada,
já que, segundo o INE, emprego não remunerado” respeita aos “trabalhadores familiares não remunerados”
mais "aos trabalhadores com emprego
por conta própria, (…), aos membros de cooperativas de produção e aos
trabalhadores destacados. Não entram nesta rubrica os voluntários.” A jornalista termina apontando que Passos
Coelho “tem razão quando refere um
aumento do emprego não remunerado, (…) com a comparação dos “trimestres homólogos, (…).” Mas que não
tem razão quando usa o indicador “emprego não remunerado” (…) “para comparar com o trabalho de
voluntariado. ([iii])”
Voltando a trás, e ao ponto em que a jornalista
diz que “não entram nesta rubrica os
voluntários.”, importa reafirmar que não são voluntariado “atuações que embora desinteressadas, (…)
sejam determinadas por razões familiares, de amizade e de boa vizinhança ([iv])”.
E que “a qualidade de voluntário não
pode, de qualquer forma, decorrer de relação de trabalho subordinado ou autónomo
ou de qualquer relação de conteúdo patrimonial com a organização promotora,” (…)
([v]).
E muito mais poderia ser recordado sobre o que determina a legislação
portuguesa sobre o voluntariado. A primeira Lei portuguesa exclusiva para o
voluntariado foi publicada há 18 anos no Diário da República. Já é adulta.
Começa a não fazer sentido tanta confusão
entre o voluntariado e os outros setores da economia. Também não se deve
confundir voluntariado com “ASU - Atividade Socialmente Útil” a
cujo desempenho podem ser obrigados os beneficiários do RSI – Rendimento Social
de Inserção, nem com a “PTFC - Prestação de Trabalho a Favor da
Comunidade que é uma pena substitutiva da pena de prisão até dois anos cuja
aplicação exige o consentimento do arguido. Consiste na prestação de trabalho
não remunerado, a favor do Estado ou de outras entidades, públicas ou privadas,
de interesse para a comunidade.” ([vi]),
nem com o “TSN - Trabalho Socialmente Necessário” que respeita à “realização de atividades por desempregados
inscritos nos centros de emprego que satisfaçam necessidades sociais ou coletivas
temporárias, prestadas em entidade pública ou privada sem fins lucrativos.”
([vii]).
A confusão a que não raras vezes se
assiste, entre a atividade de voluntariado e os outros setores da atividade
económica (mesmo social) não é privilégio deste ou daquele político, deste ou
daquele dirigente empresarial ou institucional (público ou privado não
lucrativo) nem dos inúmeros colaboradores remunerados ou não, das muitas
Organizações Promotoras de Voluntariado e de Enquadramento (ou não) de
Voluntários. É uma característica de todos nós, sejamos simples cidadãos,
sejamos gestores, técnicos, colaboradores ou até mesmo voluntários.
A cultura
que emerge dos conceitos plasmados na Lei ainda não se encontra completamente
interiorizada. É um esforço que temos que fazer. Não apenas para cumprimento do
que tenha que ser cumprido, mas e sobretudo, para que todos e cada cidadão
respeite e seja respeitado no exercício de cidadania ativa e solidária. Sabemos
que não é impossível. Apenas difícil. E querer é poder.
Porto, 11 de setembro de 2016, João António
Pereira, presidente da Direção da Federação Nacional de Voluntariado em Saúde.
[i] In.: http://smi.ine.pt/Conceito/Detalhes/703
[ii]
Jornalista do jornal “O Público” autora da peça de origem.
[iii] https://www.publico.pt/politica/noticia/o-emprego-nao-remunerado-justifica-o-aumento-do-emprego-1743346
[iv] Lei
71/98
[v] Idem
[vi] http://www.dgrs.mj.pt/c/portal/layout?p_l_id=PUB.1001.72
[vii] http://cdp.portodigital.pt/emprego/apoios-a-insercao-profissional/contrato-emprego-insercao/
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