segunda-feira, 26 de setembro de 2016

MARIA TERESA SALGADO…
… UMA MULHER DE (DA) ESPERANÇA!

Dra. Maria Teresa Salgado de Morais
Se para muita gente, há tempos e datas importantes, para si mesmos ou para os seus percursos ou projetos de vida… pode não ser menos verdade que tal possa também acontecer, relativamente a movimentos sociais e organizações, sim, porque elas também não são algo amorfo ou sem alma, porque feitas de pessoas, com pessoas e para pessoas. Vem tudo isto a propósito do seguinte:

Vinte e seis de setembro, é uma data importante na vida de uma pessoa, na vida de uma família, na vida de uma comunidade de irmãos, na vida do grande movimento que é o Voluntariado que se realiza no campo da saúde; e para a Federação Nacional de Voluntariado em Saúde. Falo da Professora Doutora Maria Teresa Cortez Salgado de Morais que inesperadamente deixou o mundo dos vivos a 26 de setembro de 2005, “apesar dos seus setenta e oito anos cheios de vida, de força, de juventude, de ternura, de alegria e de esperança.”, como alguém afirmou em peça jornalística publicada na altura.


Segundo afirmou Dom Armindo Lopes Coelho, Bispo do Porto, na cerimónia das exéquias fúnebres, “a Professora Doutora Maria Teresa Salgado Morais é uma das pessoas que nos ajuda a reavivar a fé, a compreender o que é cultivar a esperança e deixa para o mundo um apelo a essa mesma esperança.”, cuja postura, repleta de amor e de tal “simplicidade que não deixava ninguém indiferente. O seu sorriso de bondade e a forma como acolhia mostrava-nos o conteúdo do seu bondoso coração.”

Para além de ter sido Professora de Físico-Química no Instituto Superior de Engenharia do Porto e membro da Comissão Nacional para a Humanização e Qualidade dos Serviços de Saúde e da Comissão Nacional da Pastoral da Saúde, a Doutora Maria Teresa, lançou as bases e a estrutura do que é hoje o Secretariado Diocesano da Pastoral da Saúde do Porto que surgiu em 1983, onde teve responsabilidades de direção; implementou e presidiu à Associação Voluntariado do Hospital de São João – Porto  “onde se deu inteiramente aos outros, sendo este hospital a sua segunda casa.”

A Doutora Teresa foi altamente considerada pelo Conselho de Administração do Hospital de São João que em tempo, dirigindo-se o aos voluntários, lhes disse da sua (do CA) “admiração por terem resistido ao desgaste da vossa generosidade. Às vezes dão-se e não são bem compreendidos». O CA terá salientado ainda o papel “da espetacular mulher que foi a Dr.ª Teresa Salgado que ajudou a Associação a resistir à erosão sem nada receber em troca”.

Ainda Dom Armindo, viria a salientar o papel de voluntária da Doutora Teresa, afirmando que “No Hospital de S. João foi uma pioneira, uma apostola do voluntariado. Voluntariado que vinha da paixão da solidariedade, da paixão pelas necessidades dos outros.”, porque segundo ele, “estar ao serviço num hospital é sobretudo ser um apelo, uma nota de esperança para os que sofrem e estão em risco de perder a esperança. O entusiasmo na entrega total ao voluntariado com a determinação própria de quem tem ideias e as justifica pelas iniciativas. Apostolado que faz discípulos, o voluntariado atingiu uma grande importância a nível nacional e ultrapassou fronteiras.”

A Federação Nacional de Voluntariado em Saúde - FNVS também é fruto do entusiasmo, da entrega e do dinamismo da Doutora Teresa, que sempre em harmonia com o seu marido, Benjamim de Morais, dinamizou ou ajudou a criar inúmeras Organizações de voluntariado em muitas Unidades de Saúde do Serviço Nacional de Saúde, participou ao mais alto nível do Estado e aí defendeu o voluntariado no campo da saúde e de algum modo representou os voluntários, essa multidão que ainda ninguém conseguiu contar.


A FNVS “nasceu” em maio de 2007, mas esse facto foi o resultado do sonho sonhado pela Doutora Teresa e por quem a circundava na atividade, nomeadamente por quem, olhando, não apenas para o passado, mas sobretudo para o futuro, teve a coragem de, contra algumas marés vivas ou revoltosas, rasgar os mares e seguir em frente em direção à organização global do voluntariado em saúde de Portugal. Já somos muitos, mas queremos ser mais. Somos 53 Organizações de voluntariado da saúde, o (talvez) equivalente a um universo de cerca de 25 mil voluntários.

Embora possam existir diversos caminhos para que se atingir o mesmo objetivo, a verdade é que como a Doutora Teresa, continuamos a acreditar que este é o caminho. A Federação Nacional de Voluntariado em Saúde – FNVS é esse caminho para a integração, para a representação e para a defesa dos valores, dos direitos e dos interesses das inúmeras Ligas de Amigos e Associações de Voluntariado ou de Voluntários que atuam nas muitas Unidades de Saúde, públicas ou privadas, mas também nas comunidades e na educação e na promoção da saúde e de estilos de vida saudável.

Como Dom Armindo relativamente à Igreja do Porto, também nós, aqui e agora, queremos tributar à Doutora Teresa, “homenagem e gratidão”. Ela que como a mancha flutuante amarela e verde na Igreja da Trindade “fazia nascer sentimentos de alegria e de esperanças.” Também nós ousamos testemunhar “a saudade do seu sorriso que não morrerá, porque foi luz a iluminar caminhos de Esperança.” Como um dia terá ela mesma afirmado, “dar esmola material será caridade. / Mas dar a palavra firme / Dar tempo, disponibilidade / Dar-se a si mesmo… é sublime.”
Doutora Teresa! para si... a PAZ!
Nota!
Este blogue não se encontra completo. Isso só acontecerá se os leitores que conheceram e privaram com a Doutora Teresa, nos enviarem os seus testemunhos para o seguinte endereço eletrónico: geral.voluntariadoemsaude@gmail.com . Aguardamos os vossos contributos
Esta peça é da exclusiva responsabilidade de João António Pereira, presidente da Direção da Federação Nacional de Voluntariado em Saúde. Porto, 26 de setembro de 2016.

http://www.etc.pt/VP/ler_seccao2820a.html?diranter366*8%7C2


Benjamim de Morais
Benjamim Martins de Morais:

"Depois de atentamente ler o vosso texto de homenagem à Maria Teresa, sinto-me lisonjeado com a obrigação de agradecer e, convosco, continuar esta caminhada iniciada por ela. Um Bem Haja a todo(a)s.”



domingo, 18 de setembro de 2016

O AMOR jamais acabará.
É PARA SEMPRE!

Madre Teresa de Calcutá
Nos primeiros dias deste mês de setembro, aconteceu no Vaticano, o denominado Jubileu do Voluntariado e dos Operadores da Misericórdia, que terminou com a canonização da Madre Teresa de Calcutá.

Se existe consciência generalizada de que nem todos os voluntários são crentes em alguma divindade ou professam alguma religião… também é inegável que muitos deles são membros de diversas igrejas e denominações eclesiais; e que se encontram verdadeiramente empenhados na promoção do bem-estar, na ajuda desinteressada e no desenvolvimento. Essa realidade, evidenciada pela história, longe de ser fonte de dificuldade no desenvolvimento de projetos e ações de voluntariado, é antes mais e muitas vezes, uma mais valia que não pode nem deve ser escamoteada e que tem que ser querida, apoiada e acarinhada.

Na Praça de S. Pedro em Roma, estiveram muitos voluntários. Aqueles que certamente são membros da Igreja Católica Apostólica Romana; e que atuam contextualizados em Organizações tão diversas e tão conhecidas como a Cáritas, a Sociedade de S. Vicente de Paulo, os Centros Sociais Paroquiais ou as Santas Casas da Misericórdia, estruturas e serviços eclesiais que com muitas outras atuam no campo da solidariedade, das respostas sociais ou no campo da saúde, denominando-se muitas delas (em Portugal) como IPSS – Instituições Particulares de Solidariedade Social, que incluem boa parte das Organizações de Voluntariado em Saúde bem conhecidas nas Unidades de Saúde do serviço Nacional de Saúde e outras; e na comunidade.
Papa Francisco

Do que foi dito pelo Papa Francisco, pelo menos no discurso (catequese) que proferiu no dia 3 e na homilia do dia 4, é minha convicção, serem importantes algumas afirmações que logo no início do primeiro afirma que “ao contrário da fé e da esperança, o amor «jamais acabará» (v. 8): é para sempre.”(; e continua dizendo que esse amor “é um amor que permanece para sempre jovem, ativo, dinâmico capaz de atrair para si de modo incomparável. É um amor fiel que não trai, apesar das nossas contradições. É um amor fecundo que gera e conduz para além da nossa preguiça. É desse amor que todos nós somos testemunhas. (…) como um rio na cheia que nos arrasta, mas sem nos anular; muito pelo contrário, é uma condição de vida: «se não tivesse amor, eu nada seria»”.

O amor de que fala o Papa, segundo ele, “não é algo abstrato e vago; pelo contrário, é um amor que se vê, se toca e se experimenta em primeira pessoa.” Depois de aludir ao episódio do bom samaritano, Francisco afirma sem rodeios que “não é possível desviar o olhar e tomar outra direção para não ver as muitas formas de pobreza que pedem misericórdia. Isso de tomar outra direção para não olhar a fome, as doenças, as pessoas exploradas...” E dirigindo-se diretamente aos presentes, diz-lhes que “Isso é um pecado grave!” E para os cidadãos em geral, se isso não for culpa, será pelo menos ausência de cumprimento de dever e de empenhamento sério a favor dos outros cidadãos que se encontram em situação de desfavor, de carência, de debilidade, e enfermos ou incapacitados.

Referindo-se à misericórdia de Deus, Francisco disse que nunca se cansará de dizer que aquela “não é uma ideia bonita, mas uma ação concreta. Não existe misericórdia sem concretização. A misericórdia não é fazer um bem “de passagem”; significa comprometer-se onde está o mal, onde há doença, onde há fome. Onde há tantas explorações humanas. E até mesmo a misericórdia humana não é autêntica – ou seja humana e misericórdia - enquanto não alcança a concretização no seu agir diário.”
Sendo mais uma vez direto aos presentes, o Papa disse-lhe com energia “vós representais aqui o grande e variado mundo do voluntariado. (…). Vós sois artesãos de misericórdia: com as vossas mãos, com os vossos olhos, com a vossa escuta, com a vossa proximidade, com as vossas carícias... sois artesãos! Exprimis o desejo - entre os mais belos no coração do homem: fazer com que a pessoa que sofre se sinta amada. (…) enfim, onde quer que exista um pedido de ajuda, ali chega o vosso testemunho ativo e desinteressado.”

Não deixando de se dirigir diretamente aos presentes, Francisco exortou-os: - “Estai sempre prontos para a solidariedade, fortes na proximidade, diligentes para despertar alegria e convincentes na consolação. O mundo precisa de sinais concretos de solidariedade, especialmente diante da tentação da indiferença, e exige pessoas capazes de se oporem com as suas vidas, ao individualismo, pensando só em si mesmo, ignorando os irmãos em necessidade. Estai sempre contentes e cheios de alegria pelo vosso serviço, mas nunca fazei dele um motivo de presunção que leva a se sentir melhor do que os outros. (…).”

E já no discurso (homilia) do domingo, referindo-se a textos lidos no ato, o Papa dirige-se diretamente aos voluntários presentes e diz-lhes que “hoje, a “grande multidão” é representada pelo vasto mundo do voluntariado, aqui reunido por ocasião do Jubileu da Misericórdia. (…). Quantos corações os voluntários, confortam! Quantas mãos apoiam; quantas lágrimas enxugam; quanto amor é derramado no serviço escondido, humilde e desinteressado!”. E ainda que “os voluntários que servem os últimos e necessitados (...) não esperam nenhum agradecimento ou gratificação, mas renunciam a tudo isso porque encontraram o amor verdadeiro.” Porque o que os move é o amor verdadeiro. E mais uma vez: o amor verdadeiro não tem preço nem se cobra.

Ainda na sua homilia, Francisco referiu-se a Madre Teresa dizendo que “ao longo de toda a sua existência, foi uma dispensadora generosa da misericórdia divina, fazendo-se disponível a todos, através do acolhimento e da defesa da vida humana, dos nascituros e daqueles abandonados e descartados. Comprometeu-se na defesa da vida, proclamando incessantemente que «quem ainda não nasceu é o mais fraco, o menor, o mais miserável». Inclinou-se sobre as pessoas indefesas, deixadas moribundas à beira da estrada, (…)  fez ouvir a sua voz aos poderosos da terra, para que reconhecessem a sua culpa diante dos crimes ― diante dos crimes! ―  da pobreza criada por eles mesmos. A misericórdia foi para ela o “sal”, que dava sabor a todas as suas obras, e a luz que iluminava a escuridão de todos aqueles que nem sequer tinham mais lágrimas para chorar pela sua pobreza e sofrimento.”

O Papa citou Madre Teresa, que segundo ele, ela “gostava de dizer: «Talvez não fale a língua deles, mas posso sorrir»”.  E voltando-se para os voluntários presentes, exortou-os de novo, e desta vez dizendo-lhes: “Levemos no coração o seu sorriso e o ofereçamos a quem encontremos no nosso caminho, especialmente àqueles que sofrem. Assim abriremos horizontes de alegria e de esperança numa humanidade tão desesperançada e necessitada de compreensão e ternura.”([i])

Nota: não sei se consigo dizer algo mais para além do que acabo de transcrever e produzir. Mesmo assim, adianto: tenho perfeita consciência que existem voluntários a quem o que disse o Papa poderá não lhes dizer muito por não se sentirem sintonizados com aspetos de fé ou de religião. Mas há muitos outros para os quais as coisas não são bem assim. Uns e outros, todos são cidadãos. Todos os cidadãos devem (têm) que ser respeitados porque, todos eles “têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.”([ii]) E “ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.”([iii]).

Misericórdia já não é termo, tema ou coisa, que tenha apenas que ver com a esfera do espiritual e do religioso, seja no catolicismo romano seja no islamismo ou em outra denominação religiosa. “Misericórdia é um termo amplo que se refere a benevolênciaperdão e bondade em uma variedade de contextos éticos, religiosos, sociais e legais.”, e que no contexto social e legal, pode referir-se ”tanto ao comportamento compassivo por parte de quem está no poder (por exemplo, a misericórdia mostrado por um juiz no sentido de um presidiário), humanitário ou por parte de um terceiro, por exemplo, uma missão de misericórdia com o objetivo para tratar as vítimas de guerra.”([iv])

Podemos simplesmente... ser!
Misericórdia tem a ver com voluntariado, tem a ver com o voluntariado no campo da saúde, e tem a ver com todos nós. Sim, porque é o dever, é o sentido do outro, é o sentido de que cada um de nós não é uma ilha, é o sentimento de amor, é a emoção de quem ama, é a certeza que somos pessoas e cidadãos dotados de elevada dignidade; e que por isso não cruzamos os braços nem ficamos imutáveis, onde quer que exista um pedido de ajuda. Aí damos o nosso testemunho ativo e desinteressado, sem esperarmos recompensas nem mordomias. Como Madre Teresa, mesmo que não falemos a língua de quem servimos, podemos sorrir, podemos ser ajuda ativa e silenciosa. Podemos simplesmente…. Ser!
Este blogue é da inteira responsabilidade do autor: - João António Pereira, presidente da Direção da Federação Nacional de Voluntariado em Saúde. Não implica responsabilidade de qualquer outro membro do órgão citado. Porto, 18 de setembro de 2016.

sábado, 17 de setembro de 2016


SEJAMOS AGENTES ATIVOS
NA CONSTRUÇÃO DE UMA SOCIEDADE NOVA!

Dom José Ornelas, Bispo de Setúbal
Há dias em Fátima, em contexto da peregrinação aniversária de setembro, o Bispo de Setúbal Dom José Ornelas de Carvalho ([i]), apelou aos participantes no ato, para que sejam “agentes ativos na construção de uma sociedade nova”; e referindo-se aos refugiados, disse: “não olhem com indiferença para os milhões de refugiados e miseráveis, que ficam à margem das estradas da nossa sociedade. (…). Sejam portadores de vida, de misericórdia para as vossas famílias e comunidades!”; (…) e sublinhou, para além dos aspetos relativos à fé e à religião, a “importância da disponibilidade (…)” para a transformação da sociedade, em gestos concretos.

Dom José continuou: “juntos sentimos a urgência (…) de empenhar-nos seriamente na eliminação da guerra, da injustiça, da indiferença perante a miséria e os conflitos que afligem milhões de pessoas em todo o planeta”; e afirmou ainda, dirigindo-se aos presentes, dizendo-lhes que: “não vivam apenas com saudades do passado (…) não tenham medo do mundo que muda tão radical e rapidamente”.
Sobre as famílias e as situações dramáticas que muitas delas vivem, Dom José disse que devemos dar: “espaço ao acolhimento, à solidariedade e ao encorajamento, à vida e à ternura nas nossas famílias, nas suas horas felizes e, sobretudo, quando elas sentem o peso das dificuldades e das crises”, apelou ainda elogiando, por outro lado, o amor dos que até ao fim da vida “renovam, com carinho, a alegre partilha do amor que guiou a sua existência”.

D. José Ornelas, quase a terminar, convidou a uma mudança de relacionamentos, na família, na sociedade e na Igreja, onde “tantas vezes falta o vinho do amor, da ternura, da solidariedade (…) da cordialidade, da atenção aos que sofrem a fome, assim como a negligência e o abandono.”

E a nós, voluntários no campo da saúde, que tem tudo o que disse Dom José Ornelas, a ver connosco? O que foi dito é forte. É mesmo muito forte. E tem a ver connosco. Se cada um de nós quiser, é claro. Logo de início apela-se à assunção do papel de agente ativo na construção de uma sociedade nova. Mas a ação empenhada na vida da sociedade não é privilégio de alguém em particular ou de algum grupo específico. É dever de cada um e de todos os cidadãos, independentemente da sua “ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social.”; e “todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.”, e “ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever” ([ii]) em razão do que acaba de ser enunciado.

Para os voluntários do campo da saúde, olhar com indiferença quem deles se abeira, não é a sua matriz, não é o que está no seu coração e na alma, não é o seu princípio de atuação, nem é a sua prática diária. Quem se abeira dos voluntários, seja nos hospitais, nos centros de saúde ou nas comunidades, sabe e conhece bem que aqueles estão ali para atender, para acolher com solicitude, para ser recurso de complemento de bem-fazer, de ajuda à cura e à promoção do bem-estar e à qualidade de vida - vida saudável.

Essas inúmeras pessoas, ajudadas e servidas pelos voluntários do campo da saúde, como a tratada pelo “bom samaritano”, não são só daquele e de todos os tempos, mas, e sobretudo, do tempo que é o nosso. Deste tempo. Elas são refugiadas, elas são carenciadas económicas, físicas ou mentais, doentes ou moribundas e outras. Elas são, como diz o Papa Francisco, as “periferias existenciais, onde há sofrimento, solidão e degradação humana([iii])”. São quem está “out” e não “in”. E são elas que de modo gritante nos apelam a que não passemos ao lado sem fazer nada, a que, como o “bom samaritano”, continuemos a preocupar-nos com os outros, que atuemos sempre a favor do bem; e que ajudemos em qualquer circunstância, sem segundas intenções nem falsos interesses. Quem ama não cobra.

Somos muitos os que integram esta grande cruzada de fazer o bem, presente em muitas Unidades de Saúde do Serviço Nacional de Saúde e nas comunidades. Havemos de ser mais. Considerando o que disse Dom José Ornelas, juntos sentimos a urgência, mas a premência e a atualidade do empenhamento sério, não só com vista à eliminação da injustiça e da indiferença, mas também porque acreditamos que somos portadores de vida e de misericórdia ([iv]). Essa realidade pode, se quiserem, ser comparada ao “cálice que transborda” de alegria, de amor e de esperança, deixando a sua marca (positiva) quase sempre indelével em algum lugar ou em alguma pessoa.
Não tenhamos medo do mundo que muda tão radical e rapidamente. Com alegria, partilhemos Amor que guia a nossa existência e a nossa ação. Bem-haja voluntários da saúde!

Este blogue é da inteira responsabilidade do autor: - João António Pereira, presidente da Direção da Federação Nacional de Voluntariado em Saúde. Não implica responsabilidade de qualquer outro membro do órgão citado. Porto, 17 de setembro de 2016.




[i] http://www.fatima.pt/pt/news/igreja-tem-de-estar-atenta-a-familias-em-situacoes-dramaticas-diz-bispo-de-setubal-em-fatima
[ii] Constituição da República Portuguesa, artigo 13.º (Princípio da igualdade), Lisboa, 2001.
[iii] http://papa.cancaonova.com/francisco-convida-bispos-a-irem-as-periferias-existenciais/
[iv] Misericórdia é um termo amplo que se refere a benevolênciaperdão e bondade em uma variedade de contextos éticos, religiosos, sociais e legais. In.: https://pt.wikipedia.org/wiki/Miseric%C3%B3rdia

quinta-feira, 15 de setembro de 2016


Razões para comemorar
O Serviço Nacional de Saúde

Miguel Guimarães
Presidente do Conselho Regional do Norte
da Ordem dos Médicos

Se existe opinião consensual na sociedade portuguesa, a ideia que é na saúde que existe o melhor serviço público do país será, seguramente, uma das mais frequentes. Para muitos, pode não passar de um lugar-comum, debitado consoante os ventos políticos que sopram no momento. Mas, para os profissionais que nele trabalham, é, além de uma constatação justa, o reconhecimento mínimo perante a complexidade do trabalho que desenvolvem.

Diga-se o, que se disser, são eles que constituem, de facto, o maior ativo do Serviço Nacional de Saúde (SNS). São protagonistas e embaixadores em simultâneo. Vestem a camisola da causa pública. Compreendem a importância e dimensão do seu trabalho, que garante um acesso justo e equitativo à Saúde. Que providencia bem-estar e qualidade de vida a uma população que não tem oportunidade de recorrer a outros cuidados. E que assegura a manutenção de um serviço público que, pela sua natureza e definição, irá sempre garantir o que o sector privado não terá interesse em oferecer.

Olhando o exemplo dos médicos, vejo na esmagadora maioria dos 26 mil colegas que trabalham no SNS extraordinários exemplos de competência, idoneidade e dedicação. São públicos os nossos motivos de descontentamento: não existimos em número suficiente para as necessidades hospitalares e nos cuidados de saúde primários; trabalhamos com meios escassos e estruturas subfinanciadas; estamos constrangidos no acesso a meios de diagnóstico e terapêutica; penamos numa arquitetura informática pesada, burocrática e ineficiente; somos efetivamente mal pagos para o nível de qualificação técnica e de responsabilidade que a profissão exige.

É indesmentível que as condições são precárias. Poderia citar inúmeros exemplos concretos que tive oportunidade de constatar nos anos em que exerço funções dirigentes na Ordem dos Médicos. Cito dois em particular e dos mais recentes, o Hospital de Vila Real e o Centro de Saúde Fernão de Magalhães, em Coimbra. O primeiro é um verdadeiro estudo de caso: uma unidade que é sede de um Centro Hospitalar – Trás-os-Montes e Alto Douro – com mais de 450 mil utentes na sua área de intervenção, que é classificada pelo Ministério da Saúde como um hospital polivalente, mas cujos serviços estão de tal forma carenciados em termos de médicos que, na realidade, a prestação de cuidados está mais próxima de um hospital menos qualificado. O segundo exemplo, que pude testemunhar há poucos meses atrás, é possivelmente das unidades de saúde com condições físicas mais precárias e inseguras que já vi. Um espaço assustador, que desafia a integridade física dos profissionais e utentes, e que envergonha um país do mundo civilizado.

Os dois casos que refiro têm um aspeto comum: o exemplar sentido de compromisso dos seus médicos e restantes profissionais. O testemunho que recolhi em ambas as instituições - replicável em muitas outras - é de resiliência face às dificuldades e de uma grande dedicação aos respetivos serviços, que coloca os doentes e a ética profissional acima dos interesses individuais.

Esta é, felizmente, a regra e não a exceção. Os médicos não são privilegiados de coisa nenhuma. São servidores públicos de excelência e representam o que de melhor o país consegue produzir em termos académicos, técnicos e científicos. De resto, se o SNS consegue comparar, muitas vezes favoravelmente, com sistemas de saúde em países mais desenvolvidos, em muito se deve à competência e qualidade dos seus quadros.
Haja também consenso político nesta matéria. No dia em que se assinalam os 37 anos do Serviço Nacional de Saúde, reconheça-se e valorize-se o trabalho daqueles que o constroem diariamente.
MIGUEL GUIMARÃES, Presidente do Conselho Regional do Norte da Ordem dos Médicos
https://www.publico.pt/sociedade/noticia/razoes-para-comemorar-o-sns-1744059

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

A lei do voluntariado
Duarte Paiva, fundador da ACA
Portugal tem desde 1998 uma Lei Bases de enquadramento jurídico do voluntariado – Lei 71/98 de 3 de novembro. Já a primeira legislação portuguesa que aborda o tema foi em 1945 (Decreto-Lei n.º 35108). A Lei 71/98 visa definir as bases e o enquadramento jurídico do voluntariado. Porém, e desde 1998, pouco mais foi desenvolvido no campo jurídico sobre o voluntariado, à exceção de um ou outro decreto e do Conselho Nacional para a Promoção do Voluntariado.

Quando comecei a participar em voluntariado não havia qualquer enquadramento jurídico e depois de vários anos de atividade, apenas tive contacto com a legislação quando me tornei dirigente associativo e gestor de voluntariado. Ou seja, mais de metade da minha participação enquanto voluntário, foi sem conhecimento deste enquadramento legal. Esta experiência é ainda hoje a norma para a maioria das pessoas que realizam voluntariado, mas vamos por partes.

Em resumo, a origem da palavra voluntário nasce do adjetivo latino “voluntarius” que significa “capacidade de escolha ou de decisão”. Portanto “há vida para além da legislação”, ou melhor, há voluntariado para além da lei. Diria mesmo que a existência de legislação e enquadramento jurídico é quase contrária à própria conceção de voluntariado que, para além da origem da palavra que remete para a liberdade de escolha, tem ainda em muitas conceções teóricas exatamente com base na liberdade de escolha, motivações pessoais ou vontade de participar. Tudo isto remete para uma informalidade pouco compatível com legislação. Neste sentido podemos considerar que há voluntariado formal e informal, ou seja, aquele que envolve o enquadramento jurídico, regras, direitos e deveres (formal), e o informal, que está ligado à espontaneidade. Em toda esta equação, entram ainda vários valores ligados ao voluntariado como o altruísmo, a solidariedade, a dádiva ou a caridade. É normal esta relação com o voluntariado pois na realidade, a base nacional do voluntariado está historicamente ligada a ações junto da pobreza e da exclusão social, continuando ainda hoje a ser muito relevante para as organizações promotoras de voluntariado, muitas das quais de cariz religioso.
No entanto, é importante referir que podíamos viver num contexto sem pobreza e exclusão e o voluntariado poderia (deveria) continuar a existir. É enganoso pensar no voluntariado apenas como algo dependente da pobreza e desigualdades, que apenas serve para minimizar situações de exclusão e é exclusivamente altruísta. O voluntariado apenas depende da vontade livre de escolher e participar.

Agora, e por outro lado, o enquadramento jurídico dá-nos algumas coisas importantes, mesmo que possamos hoje considerar que esta é uma lei que muito necessita de revisão e atualização. Podemos até encontrar na lei atual algumas questões absurdas do ponto de vista prático. Mas é a lei que temos e que devemos, pelo menos, conhecer e estabelecer formas de a cumprir. Conhecer a lei é, para mim, essencial pois só assim haverá a possibilidade de realizar as mudanças legislativas necessárias.

Neste momento, convivemos com uma situação em que a lei é pouco conhecida e cumprida. Assim, é importante conhecer a legislação, apresentá-la em ações de formação e sensibilização e estabelecer os projetos e programas de voluntariado tendo em conta o que esta indica, sabendo, naturalmente, adequar os contextos. Penso que nesta lei existem cinco pontos importantes, os quais nos orientam neste vasto oceano que é o voluntariado.

O primeiro são as definições de voluntariado, voluntário e organizações promotoras. Vamos considerar, para este artigo, que estas definições são satisfatórias. O segundo ponto é o da gratuitidade, ou seja, quem realiza voluntariado não pode receber qualquer remuneração ou donativos pelo exercício. Isto não é o mesmo que ser compensado por gastos relacionados com o voluntariado. Ou seja, a entidade pode suportar custos diretamente relacionados (e justificados) com a atividade de voluntariado, como por exemplo as deslocações, desde que claramente relacionada com a atividade. Muitas vezes há esta dúvida.
O terceiro ponto é o caráter não lucrativo. Isto parece-me essencial, caso contrário haveria uma porta gigante para a exploração laboral. Este ponto coloca uma questão importante sobre a legitimidade do voluntariado empresarial e a ligação de organizações com fins lucrativos e o voluntariado. O quarto ponto é a formação que é apresentada nesta lei como direito e dever. Penso que este tema é um dos mais relevantes na legislação já que a formação é enormemente desconsiderada no exercício do voluntariado.

Por último, no quinto ponto, temos o princípio da complementa-ridade. Resumidamente, isto significa que o voluntariado não pode substituir os recursos humanos remunerados necessá-rios. Este ponto é fundamental pois há, em muitos casos, uma utilização abusiva do voluntariado levando a que exista efetivamente substituição de postos de trabalho. Pode parecer contraditório eu afirmar isto dado que noutro artigo já defendi o voluntariado como uma possível forma de sociedade e economia. No entanto, não é esta a realidade atual de organização social, logo não podemos transformar o voluntariado num sistema de exploração. Isto é ainda mais preocupante no caso de serviços sociais e outros que sejam garantidos por voluntariado. Como podemos esperar que um ou uma profissional da área social possa garantir a qualidade e cumprimento dos serviços? E como se responsabiliza um ou uma profissional que esteja em regime de voluntariado? Não me parece possível nem compatível.

Além destes cinco pontos, esta lei imprime ainda um outro conceito que considero muito relevante e que vai ao encontro com a verdadeira natureza do voluntariado. No Artigo 5º refere como princípio geral que “O Estado reconhece o valor social do voluntariado como expressão do exercício livre de uma cidadania ativa e solidária e promove e garante a sua autonomia e pluralismo.” O Decreto-Lei n.º 389/99 de 30 de setembro reafirma ainda mais a tónica da cidadania e liberdade afirmando que “O voluntariado é uma atividade inerente ao exercício de cidadania que se traduz numa relação solidária para com o próximo, participando, de forma livre e organizada, na solução dos problemas que afetam a sociedade em geral.” O fator de cidadania e de valores democráticos são realmente hoje relevantes no entendimento e exercício do voluntariado. A solidariedade também está expressa nesta legislação e no nosso consciente), mas creio que é aquela solidariedade que torna as pessoas iguais e não diferentes ou é incompatível com os princípios de cidadania e liberdade.
A convivência entre voluntariado e legislação não tem sido pacífica, ou melhor, não tem sido de forma alguma. Um dos motivos é que o poder político pouco está sensibilizado para o tema, e quando diz algo sobre o voluntariado demostra mesmo isso, desconhecimento. O outro é a profunda ligação caritativa que esta atividade tem na nossa sociedade. Perante todas estas dualidades e particularidades que revestem o voluntariado, então, o que fazemos? Qual o papel da legislação atual? Parece-me que deixar esta importante atividade ao “acaso” como quase tem acontecido, não é solução e pode promover situações abusivas e descredibilizar uma atividade que é parte importante da sociedade e das nossas organizações de economia social e solidária.

Neste momento, perante a lei que temos, entendo que o importante é cumprir a lei, mesmo que (e bem sei) não seja possível o cumprimento integral da mesma. Futuramente e com mais maturidade, esta lei e toda a visão jurídica do voluntariado (e até a conceção económica e social), deverá ser alvo de adequada reflexão e atualização. Esta atualização deve reconhecer a necessidade de bem organizar o voluntariado, mas tendo em conta as suas particularidades enquanto atividade de livre escolha, de cidadania ativa, democracia, solidariedade e como fonte de educação e coesão social.
Fonte: http://visao.sapo.pt/iniciativas/visaosolidaria/opiniaosolidaria/duartepaiva/2016-09-12-A-lei-do-voluntariado


domingo, 11 de setembro de 2016

PARTE IMPORTANTE DO EMPREGO EM PORTUGAL,

É EMPREGO NÃO REMUNERADO

Há dias, no discurso de encerramento da Universidade de Verão do PSD, Passos Coelho disse que “houve um aumento do emprego não remunerado e que esse emprego justifica uma "parte significativa" do aumento do emprego que se verificou no último trimestre, (…) comparando este tipo de emprego com o trabalho voluntário e recordando que Catarina Martins sempre recusou a colocação de desempregados e beneficiários de prestações sociais em IPSS.”

Passos Coelho fez notar ainda, “que desses novos empregos, 7.200 são de "trabalhadores familiares não remunerados" (o que representa mais de 30% dos novos empregos criados). No entanto, o impacto de todos os trabalhadores não remunerados (que no total do segundo trimestre atingiu os 28.700) na população empregada (mais de 4.6 milhões) ronda, tradicionalmente, os 0,5 a 0,8% desse total.” Mas quem são os “trabalhadores familiares não remunerados?” Segundo o INE (Instituto Nacional de Estatística), este tipo de trabalhador define-se com sendo o “indivíduo que exerce uma atividade independente numa empresa orientada para o mercado e explorada por um familiar, não sendo, contudo, seu associado nem estando vinculado por um contrato de trabalho. ([i])”.

Liliana Valente ([ii]) depois de afirmar que “avaliando trimestres seguidos, o número total de trabalhadores não remunerados vem subindo e descendo”, analisa outro facto: a afirmação de Passos Coelho quando compara o presente tipo de emprego ao “voluntariado., Diz a jornalista que a ideia ”está errada, já que, segundo o INE, emprego não remunerado” respeita aos  “trabalhadores familiares não remunerados” mais "aos trabalhadores com emprego por conta própria, (…), aos membros de cooperativas de produção e aos trabalhadores destacados. Não entram nesta rubrica os voluntários.” A jornalista termina apontando que Passos Coelho “tem razão quando refere um aumento do emprego não remunerado, (…) com a comparação dos “trimestres homólogos, (…).” Mas que não tem razão quando usa o indicador “emprego não remunerado” (…) “para comparar com o trabalho de voluntariado. ([iii])”

Voltando a trás, e ao ponto em que a jornalista diz que “não entram nesta rubrica os voluntários.”, importa reafirmar que não são voluntariado “atuações que embora desinteressadas, (…) sejam determinadas por razões familiares, de amizade e de boa vizinhança ([iv])”. E que “a qualidade de voluntário não pode, de qualquer forma, decorrer de relação de trabalho subordinado ou autónomo ou de qualquer relação de conteúdo patrimonial com a organização promotora,” (…) ([v]). E muito mais poderia ser recordado sobre o que determina a legislação portuguesa sobre o voluntariado. A primeira Lei portuguesa exclusiva para o voluntariado foi publicada há 18 anos no Diário da República. Já é adulta.

Começa a não fazer sentido tanta confusão entre o voluntariado e os outros setores da economia. Também não se deve confundir voluntariado com “ASU - Atividade Socialmente Útil” a cujo desempenho podem ser obrigados os beneficiários do RSI – Rendimento Social de Inserção, nem com a PTFC - Prestação de Trabalho a Favor da Comunidade que é uma pena substitutiva da pena de prisão até dois anos cuja aplicação exige o consentimento do arguido. Consiste na prestação de trabalho não remunerado, a favor do Estado ou de outras entidades, públicas ou privadas, de interesse para a comunidade.” ([vi]), nem com o “TSN - Trabalho Socialmente Necessário” que respeita à “realização de atividades por desempregados inscritos nos centros de emprego que satisfaçam necessidades sociais ou coletivas temporárias, prestadas em entidade pública ou privada sem fins lucrativos.” ([vii]).

A confusão a que não raras vezes se assiste, entre a atividade de voluntariado e os outros setores da atividade económica (mesmo social) não é privilégio deste ou daquele político, deste ou daquele dirigente empresarial ou institucional (público ou privado não lucrativo) nem dos inúmeros colaboradores remunerados ou não, das muitas Organizações Promotoras de Voluntariado e de Enquadramento (ou não) de Voluntários. É uma característica de todos nós, sejamos simples cidadãos, sejamos gestores, técnicos, colaboradores ou até mesmo voluntários. 

A cultura que emerge dos conceitos plasmados na Lei ainda não se encontra completamente interiorizada. É um esforço que temos que fazer. Não apenas para cumprimento do que tenha que ser cumprido, mas e sobretudo, para que todos e cada cidadão respeite e seja respeitado no exercício de cidadania ativa e solidária. Sabemos que não é impossível. Apenas difícil. E querer é poder.

Porto, 11 de setembro de 2016, João António Pereira, presidente da Direção da Federação Nacional de Voluntariado em Saúde.




[i] In.: http://smi.ine.pt/Conceito/Detalhes/703
[ii] Jornalista do jornal “O Público” autora da peça de origem.
[iii] https://www.publico.pt/politica/noticia/o-emprego-nao-remunerado-justifica-o-aumento-do-emprego-1743346
[iv] Lei 71/98
[v] Idem
[vi] http://www.dgrs.mj.pt/c/portal/layout?p_l_id=PUB.1001.72
[vii] http://cdp.portodigital.pt/emprego/apoios-a-insercao-profissional/contrato-emprego-insercao/
CUIDE-SE!
ALGUÉM PODE USURPAR
O IBAN DA SUA CONTA BANCÁRIA...
... E USÁ-LO

Há dias o jornal “Correio da Manhã” publicou a seguinte notícia: “Vítima de burla com o serviço (…)”. Em síntese, alguém se apoderou dos dados da conta bancária (NIB ou IBAN) de um cidadão; e na posse desses dados, firmou um contrato de prestação de serviços de comunicações com uma empresa de telecomunicações, sem sequer ter assinado qualquer documento em suporte físico. O cidadão só constatou que estava a ser lesado quando viu os valores das faturas das comunicações, estarem a ser debitados na sua conta bancária.

Embora em outros moldes, mas com semelhante finalidade, o mesmo aconteceu duas vezes com a Federação Nacional de Voluntariado em Saúde - FNVS. Da primeira vez, alguém se serviu do NIB da conta bancária da Organização, associou-se a uma Entidade de defesa de consumidores e forneceu o referido NIB para efeitos de pagamentos mensais. A Organização só tomou conhecimento da situação quando constatou que na sua conta bancária estavam (há alguns meses) a serem realizados pagamentos por Débito Direto a favor da dita Entidade.

Contactados, o Banco e a Entidade, a FNVS deparou-se com o facto de ser, digamos “complicado”, resolver a situação a seu favor. Primeiro, porque a Entidade não quis revelar a origem do uso abusivo do NIB, segundo porque no Banco não era fácil admitir que apesar da Lei, não deviam ter sido aceites as operações de Débito Direto, sem a anuência da Organização. A Organização não tinha dado qualquer ordem formal e em suporte físico, à realização das operações. Apesar de tudo conseguiu-se, não um final cem por cento feliz, mas pelo menos a cinquenta por cento. Ou seja: não se ficou a saber quem prevaricou, mas as quantias foram devolvidas à Organização. Mais tarde a Entidade falou da situação em um qualquer programa de televisão portuguesa, sem, contudo, ter referido os contornos exatos em que aconteceu, dando a impressão de auto ilibação (auto isenção de culpa - infopédia).

O segundo caso aconteceu recentemente (maio último) e ainda não se conhece resolução completa. Mais uma vez alguém, adquiriu algo a uma empresa (sobre a qual não se têm dados), e na posse do IBAN da FNVS, forneceu-o para que pagamentos mensais à empresa se realizassem por Débito Direto. Na presente data, os valores indevidamente saídos da conta bancária da FNVS, não terão ainda sido repostos. Crê-se no melhor fim.

Relativamente à notícia do jornal Correio da Manhã, o lesado, não escondendo a sua indignação afirma que “é uma falha de segurança da operadora que aceitou um contrato feito por telefone. Não deveria ter sido possível”. Já nos dois casos em a FNVS é a lesada, embora não se saiba o modo concreto como as operações comerciais se realizaram, a verdade é que houve uso usurpado dos dados do titular da conta por parte do adquirente do produto ou serviço, e apesar da Lei ([i]), houve pelo menos alguma negligência e alguma prática menos boa da parte da Entidade bancária que inevitavelmente, terá como consequência a perda da confiança dos clientes nas entidades bancárias. A FNVS rescindiu o contrato com o Banco em causa, que agora é novo.

Esta peça não se relaciona nem de perto nem de longe com o voluntariado no campo da saúde, mas a FNVS publica-a para que todos nós (pessoas e Organizações) tenhamos o maior cuidado e atenção aos aspetos das nossas contas bancárias que não nos parecem conformes. E atuemos. Se esta atitude da FNVS não for voluntariado, pelo menos é cidadania ativa e responsável.
Porto, 11 de setembro de 2016, João António Pereira, presidente da Direção da Federação Nacional de Voluntariado em Saúde.



[i] Consultar ainda:
https://www.bportugal.pt/pt-PT/pagamentos/SEPA/PerguntasFrequentes/DebitosDiretos/Paginas/DebitosDiretos.aspx