Cerca de 20% da população tem mais de 65
anos. Com a família muitas vezes a viver longe, é nos laços de amizade que os
mais velhos se apoiam, sendo Portugal um dos cinco países europeus em que os
idosos têm mais contactos com amigos
Com as famílias a escolher o litoral e as grandes cidades
para viver, é no Interior que mais idosos vivem sozinhos. As estatísticas
mostram que o fenómeno não é residual. Dos 33 963 sinalizados pela GNR no
programa Censos, 4281 residem em povoações isoladas e 3026 vivem sozinhos e
isolados. "Em situações como estas, os amigos têm um papel muito
importante, não só na companhia que fazem, mas até mesmo na prestação de
cuidados", explica ao i Verónica Policarpo, directora do
Centro de Estudos e Sondagens de Opinião.
A investigadora da Universidade Católica tem debruçado o seu
estudo sobre o papel da amizade nas comunidades pessoais, através de um
projecto de pós--doutoramento misto desenvolvido na Universidade de Manchester
e na Universidade Católica. Este será um dos estudos apresentados e um dos
temas em debate na conferência "Olhares sobre a Família", que
acontece hoje e amanhã na Universidade Católica em Lisboa.
Para a investigadora, são as fases de transição que ajudam a
configurar as redes de amigos. "O casamento, o nascimento dos filhos, o
divórcio e a entrada na reforma são alturas da vida de grande mudança e que
alteram o círculo de pessoas mais próximo", explica. Apesar da grande
importância dada à amizade, Verónica Policarpo ressalva que em Portugal "a
família é um conceito muito forte" e que, em geral, as pessoas fazem uma
distinção entre relações dadas, a família onde se nasce, e adquiridas, os
amigos, que se escolhem. No entanto, as funções de uns e outros acabam por
circular, ultrapassando a fronteira entre o que é um membro da família e o que
é um amigo.
AMIGOS NA TERCEIRA IDADE Tendo em conta os dados
do Instituto Nacional de Estatística, os números relacionados com o
envelhecimento da população são ainda mais alargados. Cerca de 400 mil idosos
vivem sós e outros 804 mil vivem em companhia exclusiva de outros idosos - um
fenómeno que aumentou 28% ao longo da última década. De forma a fazer um
enquadramento das mutações demográficas dos últimos anos, o Conselho Económico
Social de- senvolveu o estudo "O Envelhecimento da População: Dependência,
Activação e Qualidade", que também vai ser debatido durante a conferência.
No estudo, a equipa de investigadores fez um retrato da
população idosa, concluindo que "o aumento da esperança média de vida,
associado à diminuição das taxas de fertilidade, conduzirá os países europeus a
enfrentar nas próximas décadas um aumento considerável da proporção das pessoas
mais idosas". Apesar de se concluir que Portugal é um dos países mais
envelhecidos da União Europeia, um outro dado vem dar uma perspectiva positiva:
Portugal encontra-se entre os cinco países europeus em que os idosos têm mais
contactos com amigos. No total, apenas 2% da população acima dos 65 anos não
convive com amigos, pode ler-se no estudo.
Entre o apoio de amigos, família e vizinhos, Portugal
encontra-se entre os três países com um dos melhores indicadores no que
respeita à obtenção de ajuda para os idosos em caso de necessidade. Para
Fernando Chau, um dos investigadores envolvidos no trabalho, os idosos
"desconfiam dos cuidados oferecidos num lar e encaram o espaço como um
depósito onde são deixados". O investigador faz referência a um estudo de
2007 do Ministério da Saúde sobre pessoas com necessidade de cuidados
continuados, que indica que, na maioria dos casos, os familiares eram os
cuidadores informais (96,3%), seguidos dos amigos não residentes no domicílio e
dos vizinhos (29,5%). Perante este cenário, Fernando Chau reforça a necessidade
de uma maior aposta na formação dada a quem presta serviços de apoio a idosos,
mesmo que de uma forma informal, referindo-se assim a filhos, amigos, vizinhos
e GNR.
Os períodos de transição num ciclo de vida são apresentados
pelos investigadores como essenciais para a transformação de laços. Se por um
lado, com o aumento da idade diminuem as relações de amizade, por motivos como
a morte dos amigos e dificuldade de os substituir ou encontrar novas amizades,
por outro, a passagem para a idade da reforma pode ser vista como um momento de
retoma de laços antigos ou criação de novas ligações.
"Cada vez mais idosos recorrem às redes sociais para se
reencontrarem com amizades antigas", refere Verónica Policarpo,
acrescentando a tendência crescente do uso das redes para alimentar práticas
que podem dar origem a novas formas de amizade, como a criação de um clube de
leitura ou cursos especializados, actividades desenvolvidas mais facilmente com
o tempo livre oferecido pela reforma.
http://www.ionline.pt/artigos/portugal/envelhecimento-quando-familia-esta-longe-sao-os-amigos-trazer-felicidade
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