«A maior recompensa do nosso
trabalho
não é o que nos pagam por ele,
mas aquilo em que nos transforma -
John Ruskin».
O que
têm em comum uma ex-inspetora da Polícia Judiciária e um ex-professor de
línguas? Dedicam-se a dar apoio aos doentes do hospital de Portimão. O
«barlavento» esteve à conversa com ambos, a propósito do Dia Internacional do
Voluntariado, que se comemora hoje, dia 5 de dezembro.
«Acredito que o sentido da vida é dar sentido a outras
vidas», defende Fernanda Cabral Teixeira, 62 anos, coordenadora do grupo de
voluntários da associação «Elos de Esperança» da Unidade de Portimão do Centro
Hospitalar do Algarve. Esta ex-inspetora da Polícia Judiciária (PJ) formou-se
também em medicina, mas nunca chegou a exercer. A carreira policial foi
«intensamente apaixonante» e consumiu-lhe todo o tempo. Talvez por isso, tenha
encontrado no voluntariado hospitalar uma forma de estar mais perto da paixão
que deixou para trás.
Para João Marques, 67 anos, este tipo de voluntariado é
especial porque «os destinatários são os doentes. Estão física, psíquica e
emocionalmente fragilizados, e fora do seu ambiente natural. Muitas vezes, são
despojados daquilo que constitui a sua intimidade pessoal».
Encontramos este ex-professor a meio da tarde. Por esta
altura, já tinha assinado o quadro de presenças e estava equipado com a bata
amarela que identifica os voluntários. Entre as 9h00 e as 10h00 ajudou a servir
os pequenos–almoços nas urgências. Depois deu apoio aos doentes na
fisioterapia, fazendo o seu acompanhamento e transporte em cadeiras de rodas. À
tarde, regressou às urgências. À noite, daria apoio aos serviços de Medicina
Interna. Marques tem esta rotina três vezes por semana: terças, quintas e
sextas-feiras. «A nossa função é humanizar os cuidados hospitalares. Há sempre
oportunidade de ouvir os doentes. Dar-lhes uma palavra. Um gesto. O fundamental
é a interação humana e o apoio emocional. Recebo sempre muito mais do que
aquilo que dou. Aprendemos lições de coragem e de esperança», explica.
É difícil quantificar o número de pessoas que ajudam por dia.
São inúmeras e varia muito. Só entre janeiro e outubro acumularam 20966 horas
de voluntariado.
Cada voluntário contribui com o mínimo de três horas
semanais, mas há quem faça até 16. Sábados e domingos incluídos. Atualmente têm
130 sócios e 103 voluntários ativos distribuídos por 13 serviços hospitalares.
Cada serviço possui um voluntário responsável que coordena os outros. A
formação e a integração de novos ajudantes acontece assim que é reunido um
grupo mínimo de seis pessoas.
Os voluntários são na sua maioria mulheres entre os 40 e os
70 anos. «Temos, por exemplo, a voluntária mais idosa com 82 anos e a mais
jovem com 18 anos. E temos voluntárias que fazem este trabalho há 28 anos».
Marques nota que há cada vez mais interesse por parte dos jovens neste tipo de
voluntariado.
É possível tornar-se sócio da «Elos de Esperança» após o
pagamento de uma quota anual de 12 euros. O valor serve para «suportar um
conjunto de despesas», nomeadamente, o suplemento alimentar que providenciam a
alguns doentes. «Há pessoas que vêm de muito longe para consulta ou tratamento.
Muitos não têm condições económicas para mais despesas. O suplemento alimentar
que fornecemos pode significar a única refeição do dia», sublinha Teixeira.
Facultam pacotes de bolacha, sumos, chás e águas. Distribuem ainda roupas para
adultos e crianças «sinalizadas» pelos serviços sociais.
«Ser-se voluntário hospitalar é diferente. Algumas pessoas
desistem ainda durante a fase de integração. É mais exigente e envolve gerir
muitas emoções. Ou se quer mesmo muito, ou não se consegue», garante Teixeira.
«Há doentes cuja família não tem possibilidade de acompanhá-los, e outros que não têm mesmo ninguém. Especialmente os idosos. Recordo-me de um senhor com cerca de 80 anos, de Monchique, que não tinha rigorosamente ninguém. Estava sempre ansioso pela nossa visita. Era o momento reconfortante do dia. A nossa companhia era muito importante para ele. Do hospital seguiu para um lar», relembra.
«Há doentes cuja família não tem possibilidade de acompanhá-los, e outros que não têm mesmo ninguém. Especialmente os idosos. Recordo-me de um senhor com cerca de 80 anos, de Monchique, que não tinha rigorosamente ninguém. Estava sempre ansioso pela nossa visita. Era o momento reconfortante do dia. A nossa companhia era muito importante para ele. Do hospital seguiu para um lar», relembra.
Na Oncologia, onde muitos doentes fazem quimioterapia, «é
desgastante estarem sozinhos todo o dia. São doentes altamente fragilizados»,
por quem Teixeira nutre um carinho especial. Nesta secção, recorda-se ainda de
uma outra história: «conheci uma paciente extremamente arrogante. Mas eu
mantive sempre a minha postura e sorriso. Passado algumas semanas, chegou ao pé
de mim e pediu-me um abraço. Disse-me para nunca deixar de sorrir. Ganhei o
dia!», confidenciou.
Teixeira termina com uma referência a John Ruskin, que diz
que se adequa na perfeição a este voluntariado: «a maior recompensa do nosso
trabalho não é o que nos pagam por ele, mas aquilo em que nos transforma».
(...)
por Sara Alves / Barlavento Algarvio
Sem comentários:
Enviar um comentário