terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Pelos caminhos do Voluntariado...

«A maior recompensa do nosso trabalho
não é o que nos pagam por ele,
mas aquilo em que nos transforma -
John Ruskin».

O que têm em comum uma ex-inspetora da Polícia Judiciária e um ex-professor de línguas? Dedicam-se a dar apoio aos doentes do hospital de Portimão. O «barlavento» esteve à conversa com ambos, a propósito do Dia Internacional do Voluntariado, que se comemora hoje, dia 5 de dezembro.

«Acredito que o sentido da vida é dar sentido a outras vidas», defende Fernanda Cabral Teixeira, 62 anos, coordenadora do grupo de voluntários da associação «Elos de Esperança» da Unidade de Portimão do Centro Hospitalar do Algarve. Esta ex-inspetora da Polícia Judiciária (PJ) formou-se também em medicina, mas nunca chegou a exercer. A carreira policial foi «intensamente apaixonante» e consumiu-lhe todo o tempo. Talvez por isso, tenha encontrado no voluntariado hospitalar uma forma de estar mais perto da paixão que deixou para trás.
Para João Marques, 67 anos, este tipo de voluntariado é especial porque «os destinatários são os doentes. Estão física, psíquica e emocionalmente fragilizados, e fora do seu ambiente natural. Muitas vezes, são despojados daquilo que constitui a sua intimidade pessoal».
Encontramos este ex-professor a meio da tarde. Por esta altura, já tinha assinado o quadro de presenças e estava equipado com a bata amarela que identifica os voluntários. Entre as 9h00 e as 10h00 ajudou a servir os pequenos–almoços nas urgências. Depois deu apoio aos doentes na fisioterapia, fazendo o seu acompanhamento e transporte em cadeiras de rodas. À tarde, regressou às urgências. À noite, daria apoio aos serviços de Medicina Interna. Marques tem esta rotina três vezes por semana: terças, quintas e sextas-feiras. «A nossa função é humanizar os cuidados hospitalares. Há sempre oportunidade de ouvir os doentes. Dar-lhes uma palavra. Um gesto. O fundamental é a interação humana e o apoio emocional. Recebo sempre muito mais do que aquilo que dou. Aprendemos lições de coragem e de esperança», explica.
É difícil quantificar o número de pessoas que ajudam por dia. São inúmeras e varia muito. Só entre janeiro e outubro acumularam 20966 horas de voluntariado.
Cada voluntário contribui com o mínimo de três horas semanais, mas há quem faça até 16. Sábados e domingos incluídos. Atualmente têm 130 sócios e 103 voluntários ativos distribuídos por 13 serviços hospitalares. Cada serviço possui um voluntário responsável que coordena os outros. A formação e a integração de novos ajudantes acontece assim que é reunido um grupo mínimo de seis pessoas.
Os voluntários são na sua maioria mulheres entre os 40 e os 70 anos. «Temos, por exemplo, a voluntária mais idosa com 82 anos e a mais jovem com 18 anos. E temos voluntárias que fazem este trabalho há 28 anos». Marques nota que há cada vez mais interesse por parte dos jovens neste tipo de voluntariado.
É possível tornar-se sócio da «Elos de Esperança» após o pagamento de uma quota anual de 12 euros. O valor serve para «suportar um conjunto de despesas», nomeadamente, o suplemento alimentar que providenciam a alguns doentes. «Há pessoas que vêm de muito longe para consulta ou tratamento. Muitos não têm condições económicas para mais despesas. O suplemento alimentar que fornecemos pode significar a única refeição do dia», sublinha Teixeira. Facultam pacotes de bolacha, sumos, chás e águas. Distribuem ainda roupas para adultos e crianças «sinalizadas» pelos serviços sociais.
«Ser-se voluntário hospitalar é diferente. Algumas pessoas desistem ainda durante a fase de integração. É mais exigente e envolve gerir muitas emoções. Ou se quer mesmo muito, ou não se consegue», garante Teixeira.
«Há doentes cuja família não tem possibilidade de acompanhá-los, e outros que não têm mesmo ninguém. Especialmente os idosos. Recordo-me de um senhor com cerca de 80 anos, de Monchique, que não tinha rigorosamente ninguém. Estava sempre ansioso pela nossa visita. Era o momento reconfortante do dia. A nossa companhia era muito importante para ele. Do hospital seguiu para um lar», relembra.
Na Oncologia, onde muitos doentes fazem quimioterapia, «é desgastante estarem sozinhos todo o dia. São doentes altamente fragilizados», por quem Teixeira nutre um carinho especial. Nesta secção, recorda-se ainda de uma outra história: «conheci uma paciente extremamente arrogante. Mas eu mantive sempre a minha postura e sorriso. Passado algumas semanas, chegou ao pé de mim e pediu-me um abraço. Disse-me para nunca deixar de sorrir. Ganhei o dia!», confidenciou.
Teixeira termina com uma referência a John Ruskin, que diz que se adequa na perfeição a este voluntariado: «a maior recompensa do nosso trabalho não é o que nos pagam por ele, mas aquilo em que nos transforma».
(...)
por Sara Alves / Barlavento Algarvio

Sem comentários:

Enviar um comentário